No século XIX e no início do século XX, havia um costume entre os exploradores de descobrir lugares nunca antes vistos. Os grandes descobrimentos arqueológicos daqueles tempos, como as tumbas faraônicas do Egito e a cidade perdida de Machu Picchu, fizeram com que o Coronel Percy Fawcett embarcasse em várias expedições também em busca do desconhecido.
Nascido em Devon, na Inglaterra, em 1867, Fawcett era um aventureiro conhecido pelo destemor e pela resistência física. Criado no auge do Império Britânico, aquele sobre o qual o sol nunca se punha, canalizou seu caráter forte e arrogante a serviço da conquista de territórios para a Rainha. Em 1886, entrou para a Royal Artillery e acabou escalado para trabalhar no Ceilão (atual Sri Lanka), onde conheceu a sua esposa. Depois, trabalhou como agente secreto britânico na África Meridional, Malta, Hong Kong, Marrocos e Irlanda. Foi justamente durante sua viagem pela África que aprendeu técnicas de sobrevivência na selva, que lhe seriam úteis em suas expedições por terras brasileiras.
Fawcett esteve no Brasil pela primeira vez em 1906, numa viagem da Royal Geographical Society, organizada com a finalidade de mapear a Amazônia. Ele atravessou a selva, chegando a La Paz, na Bolívia, em junho desse mesmo ano. Depois desta, realizou mais sete expedições pelo Brasil entre 1906 e 1924. Durante esse período, fez contato com vários grupos indígenas, com os quais conheceu lendas e tradições, e usou sua habilidade de conquistar os povos que habitavam os locais explorados, dando-lhes presentes. Sua visão de mundo, centrada na suposta superioridade britânica, fez com que descrevesse os outros povos com uma série de preconceitos: sujos, ignorantes e atrasados – embora pudesse ter compaixão pelos índios e raiva dos europeus sem escrúpulos que buscavam a fortuna fácil. Essa crença na superioridade do homem europeu era baseada em uma teoria elaborada pelos filósofos naturais no século XVII, chamada ”Teoria da Cadeia do Ser”, em que os negros e os índios eram considerados quase humanos – seguindo a seguinte hierarquia: índios abaixo dos brancos e negros abaixo de todos – sendo vistos como ignorantes e incapazes de realizarem feitos que os europeus ocidentais tinham conseguido até então. Tais argumentos explicavam o motivo de ambos serem escravizados sob as políticas colonialistas das potências europeias durante toda a Era Moderna, e representaram uma arma de ataque de 1° linha contra os povos dominados por mais de um século.
Entre essas expedições, Fawcett retornou à Inglaterra para servir ao Exército britânico durante a Primeira Guerra Mundial, mas, logo após o fim da guerra, retornou ao Brasil para estudar a fauna e arqueologia local. Em 1912, deu de cara com um documento supostamente escrito por bandeirantes no século XVIII e traduzido para o inglês por outro aventureiro britânico, Richard Burton. Era a descrição de uma cidade de pedra abandonada no sertão baiano. Há quem diga que era uma cidade perdida construída pelos descendentes dos hipotéticos habitantes de Atlântida. O que o movia era a obsessão em encontrar a tal cidade perdida, que ele chamava de Z. Em 1925, convidou seu filho mais velho, Jack Fawcett, e um amigo de Jack, chamado Raleigh Rimmell, para acompanhá-lo em uma missão em busca da cidade perdida de Z. Eles, então, partiram para atravessar a região do Alto Xingu, e nunca mais voltaram.
Nas décadas seguintes ao desaparecimento, foram montadas várias expedições de resgate, sem qualquer sucesso. A verdade sobre o fim de Fawcett, Jack e Rimmel perdia-se no embaraço de versões contadas pelos índios. Fawcett tornara-se lenda, objeto de relatos míticos que se complementavam ou se contradiziam entre si. Houve quem sustentou que, muito anos depois de sumir sem deixar traço, Fawcett ainda estaria vivo, morando com os indígenas depois de ter se desiludido com a civilização ocidental da qual provinha. Outras pessoas acreditavam que ele teria sido assassinado por índios depois de algum desentendimento. Em versões diferentes, ele teria sido devorado por canibais.
Em 1952, Assis Chateaubriand, capo dos Diários Associados, resolveu promover a sua própria expedição. Na verdade, Chatô já acompanhava o caso Fawcett com interesse desde o desaparecimento do aventureiro. Em 1943, uma missionária relatou ter encontrado um índio de pele clara e olhos azuis, que seria filho de Jack Fawcett com uma índia. Chatô destacou seu repórter Edmar Morel, que foi ao Xingu e lá encontrou o índio Dulipé, apresentado aos leitores do Diário da Noite como “o deus branco do Xingu”. Dulipé foi levado à civilização, onde foi confirmado que ele não passava de um índio albino. Morreu anos depois em Cuiabá, consumido pelo álcool. O motivo da expedição de 1952 foi a notícia de que o sertanista Orlando Villas Boas tinha obtido dos índios calapalos a confissão de que tinham, de fato, assassinado Fawcett e seus companheiros em 1925. Admitiram o crime depois de se certificarem de que “os brancos não estavam mais brabos” com o sumiço de Fawcett.
Indicaram também o local onde o corpo fora enterrado, e lá uma ossada foi encontrada em cova rasa. Brian, o outro filho de Fawcett, veio da Inglaterra para acompanhar o desenrolar dos fatos. Chatô farejou uma grande história e reuniu um time de repórteres da revista O Cruzeiro para a cobertura.
Callado, que trabalhava no jornal Correio da Manhã, foi convidado para a missão. Levar um repórter do concorrente a tiracolo em uma cobertura sensacional: eis aí um fato inédito na história da imprensa brasileira, talvez mundial, e que só poderia ser fruto da cabeça heterodoxa de Chatô. A história terminou em fiasco. Submetidos a exames antropométricos, os ossos não puderam ser identificados como pertencentes a Fawcett. A arcada dentária não correspondia e a altura também não batia com os registros físicos que se tinham do expedicionário. Mesmo assim, Villas Boas manteve, até o fim da vida, a convicção de que aqueles ossos pertenciam ao aventureiro inglês. O sertanista conservou o esqueleto em sua casa, debaixo da cama, por 18 anos, até que, pressionado por sua mulher, enviou-o ao Instituto Médico Legal da USP, onde espera por um teste de DNA que os remanescentes da família Fawcett se recusam a realizar. Permanece o mistério. E, portanto, continua o estímulo para boas histórias em torno do caso. Tudo é mito.
São muitos os boatos que atribuem ao explorador a inspiração do escritor Rob MacGregor para criar as aventuras de Indiana Jones, imortalizado no cinema por Steven Spielberg e na pele do ator Harrison Ford. O explorador também inspirou Sir Arthur Conan Doyle, o “pai” de Sherlock Homes, especialmente no livro ‘O Mundo Perdido’ e, mais recentemente, é retratado pelo ator Charlie Hunnam no filme ‘Z – A Cidade Perdida’.
‘Z – A Cidade Perdida‘, com Tom Holland, Charlie Hunnam, Robert Pattinson e Sienna Miller, estreia no Brasil no dia 1 de Junho de 2017, distribuído pela Imagem Filmes.
Texto escrito por: Lucas, Graduando em História na UEM e membro da equipe do Tom Holland Brasil. ■ Referências:
Texto escrito por: Lucas, Graduando em História na UEM e membro da equipe do Tom Holland Brasil.
■ Referências: